Nasci em São Romão, Seia a onze de novembro de mil novecentos e sessenta e um. Sei que fui abençoado pelo papa Paulo VI. O meu pai é encarregado de produção na fábrica de Seia. Durante os três primeiros anos da minha vida de nada me lembro. Recordo-me agora de ter gatinhado a noite para o quarto da empregada que chegou naquele dia e ter sido objeto sexual. A senhora despediu-se no dia seguinte e nada mais sei sobre ela. Andei de triciclo e fui mordido por um cão que a seguir foi abatido. Brinquei aos médicos com as vizinhas e uma era minha namorada. Dancei nos bailes populares muito agarradinho com as filhas das empregadas e até com a filha do médico da fábrica. Frequento a igreja, mas não me interessa muito a catequese. Prefiro matar pássaros e precorrer os pinhais com vitalidade. Num dia de abril fui a escola e mandaram-me para casa. A revolução tinha acontecido, no primeiro de maio eu e a minha família fomos ameaçados de morte. Passou apenas uma semana para perder os bons amigos e me ver no meio do mato com comunistas da Associação vinte cinco de abril. Pois foi ali mesmo que com doze anos fui enrabado e espancado pelos onze pulhas do partido. Solitário e com más notas cheguei-me aos hippies mais velhos que me puseram a fumar erva. Chego a casa e os meus pais levam-me ao médico. Com os comprimidos punha a cabeça na sopa e fazia nódoas a borbulhar com a boca. Cada vez fico mais sozinho. Quando posso vou cravar uma passa aos ciganos a troco de algum objeto gamado. Tenho mais dois amigos que são da UDP e do grupo amizade Portugal-China. De resto só conheço um junkie no café. Dá-me ganza e inicia-me no fumo da heroína. Tenho uma conta na Caixa Geral de Depósitos criada pelo meu pai. Derreto a conta e levo um encherto de porrada do meu progenitor. Tenho dezasseis anos e fujo de casa. Tomei boleia e tenho fome. Pela noite perto do parque Eduardo VII encontro duas prostitutas a parar um cliente. Sou menino, vendo o cu e ganho quinhentos escudos, com cada chinesa a cem escudos, ainda tenho a casa do cliente onde durmo, como e levo no cu. Tenho dois caminhos onde posso ganhar dinheiro, a prostituição e a droga. Aos dezassete anos estou muito magro e tenho dinheiro para pagar um apartamento, droga e alimentação. Estou a saida de Lisboa a apanhar boleia, destino, São Romão. Os meus pais choram nos meus braços e afirmam ser sempre bem vindo e ter o meu quarto e comida a disposição. O meu destino é Espanha, combinei com um camionista passar o produto vindo da Suíça e carregar a droga leve em Salamanca. O camionista acha-me um puto lindo e tem tendências. Sou homossexual assumido e lido com os consumidores, estes são certos e diários. Começo a injetar e a conta bancária a subir. Tiro a carta e às vezes faço fretes a putos que andam na vida. Mensalmente vou às minhas origens ver a família que não suspeita da minha duplicidade. Agora só às vezes me prostitui-o , quando tenho necessidade na maioria das vezes pago para ter. Vou a encontros nas praias e festas restritas. Todos sabem que tenho pacotes para vender. No último verão usávamos grandes colheres onde o açúcar amarelo se derretia e fornecia várias seringas. No entanto este verão surgiu uma doença chamada SIDA e o ato comunal passou a ser singular. Saio de Lisboa e vou para o Algarve onde tráfico de drogas leves é o dia a dia de muitos. O circuito do cavalo é mais fechado e proibitivo. Quando a homossexualidade passa-se em hotéis e muitos clientes são estrangeiros. Tenho agora vinte anos e injeto pelo menos quatro vezes ao dia. Os circuitos mudaram, a maioria dos agarrados negoceia com os ciganos, mas não é o meu caso. Consigo melhor qualidade e não me falta um círculo de clientes. Tenho um problema, adormeço em qualquer lado, quando dou por mim estou a dormir no sitio menos indicado. Até aos vinte e seis anos o tempo correu devagar e sem contratempos. Até que fui agarrado pela polícia com cem gramas de heroína. Logo fiquei preso, no tribunal ficaram com o dinheiro da minha conta bancária e o carro nunca mais o vim a ver. Fiquei preso em Lisboa durante quinze dias para ser transferido para a Guarda onde me aguardam quatro anos de pena. Comecei a ser tratado com metadona e engordei um pouco. Os meus familiares vao-me visitar de quinze em quinze dias. Os meus companheiros de cela foram presos pela mesma razão. Todos temos saudades de um bom fix de cavalo. Saio ao fim de dois anos e vou para casa de meus pais. Logo deixo a metadona e vou a boleia para a noite de Viseu. Forneço me em São Romão e quando tenho mais algum vou buscar a Espanha a metade do preço. Acabo de comprar um carro em segunda mão e tenho uma casa degradada em Leiria onde há mais clientela. Foi ai que aprendi a comer moscas, caçar e comer moscas. Começavam os anos difíceis do agarrado que eu sou. Já muitos morreram de overdose e SIDA. O produto estragado é o meu maior medo. Saio ao pôr do sol e vou para a beira rio, a ponte é o local a noite onde arranjo clientes. Quando o dinheiro escasseia e começam as ressacas saio de casa de dia e vou para locais de encontro como a praia do Norte ou as casas de banho de Fátima. Existem também cafés de referência e até bancos de jardim. Por ter aprendido a comer moscas e outros tipos de insetos ao fim de dois anos desenvolvo uma língua tipo camaleão. De resto a alimentação é escassa é a própria heroína que alimenta o sangue. As cenas de Leiria estão a tornar-se perigosas. Uma rapariga chamada Luísa do Porto controlou um apartamento no Bairro Norton de Matos em Coimbra e convidou-me para ir com ela. Em Coimbra ao fim de um ano deixei a prostituição homossexual e vivo com Luísa uma relação hetero. Temos meia dúzia de clientes certos que passam cá por casa todos os dias. Pela manhã vou de carro fornecer-me em ciganos. Com o tempo os ciganos um a um vão sendo presos. Volto a ir carregar em Espanha e obtenho mais lucro. Ao fim de algum tempo sabemos estar a polícia a perna. Em Braga num bairro social existe um apartamento ideal e as poupanças dão para consumir até restabelecer contatos na área. A mudança foi rápida no novo sítio ninguém suspeita ou sabe quem nós somos. A referência fica em Vigo, mas clientes ainda não há. Passadas umas semanas abrimos negócio de cocaína e MDMA com estudantes universitários. Sairam-nos consumidores certos e constantes. Com o hábito de comer insetos sou rápido da língua e apanho qualquer mosca que se aproxime. O ato continuado de injetar-me levou a que não tenha marcas de tal prática. Em Braga temos uma divisão da casa cheia de pacotes de drogas de todo o gênero. Não interessa a identidade bancária que nos lava o dinheiro. O certo é que nunca nos perguntam qual a origem. Acho melhor comprar um café que está a ser trespassado e um apartamento no mesmo edifício. Como tenho alergia ao trabalho a Luísa e as suas amigas fazem os horários. Passo a vida a ouvir música e a beber chá. Mas o fornecedor de pastelaria adultera os bolos com um produto tóxico. Temos uma inspeção da ASAE e eu o proprietário sou dado como cúmplice. Além dos dois anos de prisão suspensa apanho mais três de condenação. O café fecha e fica em venda em hasta pública. A Luísa vai-me visitar de quinze em quinze dias e quando estamos em entimidade dá-me mil euros. Mando todos os dias quando me levanto um fix de heroína e outro a hora do lanche. Tudo é secreto só sabemos que alguns guardas prisionais estão envolvidos e fazem muito dinheiro. Vejo na televisão que querem fazer um Bigbrother com presidiários, concorro e para minha grande surpresa sou selecionado. Fizemos todos logo uma festa secreta de que ninguém ouviu falar. Tenho dois guardas a vigiar- me e um motorista. Saio da penetenciaria e vou para o estúdio vinte e quatro horas em direto. Entro pela casa das pessoas e imponho a minha personalidade. E bem vigiado pelos guardas passo a viver nos estúdios onde permaneço nos canais televisivos dois anos até um juiz me mandar em liberdade para o pé da minha Luísa. Os dois decidimos parar com os negócios, comprar uma vivenda no Algarve e entrar num franchising de roupa. Nos circuitos de heroína do Algarve existem vários negócios e um deles é saciar sexualmente turistas. Uso bigode e faço circuitos turísticos com as estrangeiras. Entre a praia e os monumentos vou-me entretendo. O meu sócio, pescador algarvio convidou-me para passar a fronteira na sua carrinha de frio. Deixamos cinco caixas de lagostim e outras quatro de salmonete, para o almoço temos seiscentos gramas de cada um. Luísa teve um grave acidente na nacional cento e vinte e cinco e não sobreviveu. O funeral no cemitério de Faro contou com poucas pessoas, chorei, ela nada deixou e filhos nunca teve. Meti-me a estrada e volto para São Romão, os meus pais já têm idade avançada, o meu quarto está como sempre esteve. Fico quinze dias e gasto trinta pacotes, todos estes anos que estive agarrado a heroína gozei de boa saúde. Vi muitos ressacar e dar chutos de má qualidade, outros a ficarem com SIDA e muitas outras maroscas criadas por terceiros. Este é um vicio em que se acaba por gastar cerca de cem euros por dia, ou seja é um vicio só sustentado por executivos e quem tenha um grande ordenado de forma a não ser suspeito, um segredo bem guardado. Só me custaram os dois anos de prisão a que estive a metadona. Não é vulgar um menor ter de vender o corpo, mas filo como um hábito,como fosse borracha sem endereços. Nós toxicodependentes não temos grande apetite pois a heroína é um alimento para o sangue e muitos ganham barriga porque são obrigados a comer. A droga é própria de marinheiros porque dá resistência às condições adversas do mar e é ao mesmo tempo um negócio. Pois decido ficar em São Romão, comprar uma vivenda e combater os ideais de esquerda que me configuraram a vida a esta guerra. Boicotar os ideais da Associação vinte e cinco de abril, denunciar a fraude dos funcionários de saúde membros do partido e construir uma fábrica para dar mão de obra. Acordei na casa do meu familiar na Suíça, acabei de fazer uma transfusão de sangue numa clínica privada. Em princípio acabou o vicio, vou estar quinze dias a passear pelas montanhas e a comer salchichas e produtos lácteos. A construção dos três pavilhões da fábrica vão em pleno. Frequento o bar do meu amigo e reencontro amizades de antes da revolução, de quando éramos menores. Já conotado como sendo de um partido de extrema direita e tendo levado os meus amigos a esta razão extrema convido o presidente da confraria para a inauguração da minha indústria que vai empregar muitos jovens desorientados da vila e ganhar o dobro do ordenado mínimo. Recebo um aviso do Facebook por ter escrito, juro por Deus, Pátria e Rei acabar com todos os membros do MPLA, FRELIMO e PAIGC, claro desinstalei do meu telemóvel essa maldita aplicação. Os meus amigos fumam drogas leves, bebem bebidas alcoólicas e comem petiscos. Gostam de música Rock e Punk. Como sempre esperávamos a segunda república poderá cair. A tensão é imensa, os cabecilhas vermelhos convocam greves recebendo dinheiro de Moscovo e Pequim, o suficiente para ser rico. Uma vez que falta o vinho nos quartéis dao-se os primeiros tiros. Para Sul há muito cagalhão a morrer, por aqui apenas ajustes de contas. Não ficam vivos os inimigos do Senhor. E a senhora diz-me: - Não te lembras de mim, dançamos agarradinhos. Agora sou divorciada de um homem com dívidas e de que já não sei o paradeiro. Tenho a meu cargo dois filhos maiores, um rapaz e uma rapariga, não têm emprego, porque não poderás ajudá-los? E eu respondo, a leste da Ucrânia são todos pardos. Aliás ainda há muita mão de obra disponível para todos os cheios de educação das escolas públicas do país. Com certeza a tua sobrinha é mamuda e gosta de pássaros. Já passaram seis meses que lavei o sangue na Suíça em casa dos meus familiares,A empresa tem uma rentabilidade de duzentos por cento. Subo os salários frente a uma crise geral de racionamentos e cortes. Leva-me agora a pensar as vitórias do comunismo na cidade dos estudantes e no mapa do Cairo. Claro a Europa cai para poder muçulmano e a Suíça acentuará no mapa. Uma Europa toda vermelha não fosse o Holocausto atómico ocorrer primeiro. São esses os planos do inimigo que habita no continente inabitável, a África. A fábrica de putins em miniatura continua a ser um êxito é a vontade do povo, dos otomanos o paralelo ao fim do mundo do petróleo. As universidades dos pilins da desgraça, também se borram todos aquando da morte dos seus chefes de Estado. As finanças não aguentam mais esses torrados e institucionalistas. Assim a fundação do novo ser de Estado urge desta inevitável revolução.
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